05 abril 2017

Nossa Casinha Amarela!


Quando eu era criança passava as férias de verão na casa de praia dos meus avós. Perto de lá havia uma casa amarela, de madeira, sempre com a grama bem verdinha em volta; A casa tinha uma varanda de vidro e dava pra ver do lado de fora que, por dentro, era tudo muito rústico e arrumadinho. O quintal era amplo e tinha até rede para jogo de vôlei.
Sempre que passava por ela, eu ficava imaginando como seria bom o dia que eu tivesse dinheiro para comprá-la, e isso me motivava a estudar mais, brincar mais. Eu sabia que se me esforçasse bastante eu conseguiria e ia ter momentos muito felizes lá. Repetia esse ritual por muitos verões, passava em frente, sonhava acordada, abria um sorriso e tinha a certeza que iria cuidar bem daquele pedacinho de mundo.
Pouco mais de um ano, devido a fortes chuvas, um poste caiu em cima da casa, o curto-circuito provocou um grande incêndio que a fez desabar. Não sobrou nenhuma das tábuas amarelinhas pra que eu pudesse guardar de recordação. A construção agora dará lugar a uma nova casa, ou um prédio ou até mesmo uma vendinha de doces... Quem sabe? A placa do terreno marcado pelo fogo só diz "vende-se", junto ou número de telefone do dono. Não me deram nenhuma satisfação do que poderá surgir no "meu" cantinho. Isso me agoniou tanto. Ahhh como essa incerteza atormenta.
 A casinha deixou um vazio no meu peito e por um tempo eu fiquei procurando motivação pra continuar. Mas agora que não tem mais a casinha, para quê juntarei dinheiro? Para quê trabalharei bastante e juntarei o dinheiro se ela não está mais lá? Eu, que tanto gostava de me imaginar morando lá, agora terei que procurar outra casinha pra sonhar? Ou construo uma nova casa? Mas e as lembranças que não serão iguais.  -Ah, deixa isso pra lá, vou pensar em outra coisa, outro terreno, outra casa... Será? 
-Não dá, não! Eu quero aquela casa! Igual! Não quero outra!
Eu ainda passava lá e ficava de vigia, cuidando do terreno, imaginando a casa de volta e tempo depois me ajuizava do quão boba era por ficar pensando e naquilo. 
Porque insistimos em fazer isso? Zelar, vigiar aquilo que "não é mais nosso"? Assim como o terreno e como a casinha amarela, são as nossas relações, é a nossa vida! Somos tão fiéis ás memórias, ás boas recordações, ao que "acreditamos" ser o motivo do nosso acordar matinal, que não abrimos o coração para as novas possibilidades.
Que saudável era quando eu fuxicava com os vizinhos da casa de praia pra saber o que construirão naquele terreno? E se me dissessem que será construído um prédio na cor roxa? Sempre detestei a cor roxa e mais ainda a possibilidade de um prédio naquela praia. Qual o sentido de me torturar com isso? Mas e você? Que saudável é você perguntar a um colega como anda o relacionamento interpessoal naquela empresa que você foi demitido depois de brigar com alguém? Vai te fazer bem saber que a noiva do seu primeiro namorado estava linda na formatura de Direito e que nesse dia ela deu a notícia que eles estavam esperando o primeiro filho?
Isso é tortura desnecessária. Superar é preciso, e pra isso é preciso desatar amarras com o passado.
Desejar o melhor às pessoas que entram e saem da nossa vida é o mínimo que se espera de nós, seres humanos. Mas o ego nos fere, o orgulho... E é nessa hora que temos que nos frear, parar de depositar emoções em relações falidas, em objetivos inalcançáveis. 
Saber a hora de abrir o coração para novas possibilidades é mais umas das chaves para a felicidade. 
Trace novas metas, concentre-se no seu novo trabalho, no seu novo amor, na nova casa ou pelo menos lute para obter toda essa novidade boa.
Quem nunca teve uma casinha amarela que pegou fogo e desestabilizou estruturas, modificou sonhos?
Dá um medo só de imaginar alguém fazendo a nossa função no trabalho, na nossa rotina. Dá um medo gigante só de imaginar que alguém possa "roubar' nosso lugar na vida "daquela pessoa". Dá um medo de mudar os planos, desviar o foco, eu sei! 
O tempo entre a mudança de plano, a desestruturação do ideal, a aceitação e a percepção da melhora é looooooooooongo, doloroso... Mas temos que acreditar! Crescemos rodeados de exemplificações que mostram incansavelmente uma mudança, quase sempre, benéfica. No mínimo nos trará experiência. É só observar com atenção.
Quer um exemplo?
Lembra de quando andávamos de bicicleta com rodinhas? Era seguro, prático, não tinha risco de cair. Pra quê tirá-las? Pra quê sair do certo, do confortável? O choro, o medo... Nossos pais nos impuseram essa "dureza" porque já sabiam que seria o melhor pra nós, a gente só acreditou quando viu o resultado. Aprendeu a pedalar sem as rodinhas.
E que sensação, eim? Liberdade, movimento, velocidade....  
Quem sabe o destino não é como nossos pais? Tirando algo da gente para que tenhamos algo muito melhor, que faça a gente mais feliz. 
É assustadora a possibilidade do novo, do incerto. Medo de que algo seja construído sobre as nossas recordações, sobre o que sonhamos, planejamos, sem que estejamos mais presentes. Mas acredite, é mais assustador depositar energia, expectativa, tempo, amor em algo que não vai dar retorno, projetos que não se realizarão. Viver na inércia não é viver, é apenas existir! 
Que tal tentar algo diferente... Vamos abrir a cabeça e o coração para as novas possibilidades?

Obs: Estou de olho em um apartamento no centro da cidade, é um prédio que aceita animais e eu sempre tive vontade de ter cachorro mesmo. Dizem também que o bistrô que tem ao lado dele é maravilhoso. Quero conhecer 💖

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